(Benildo Nery)
Eu tenho um grande
amigo
No Sítio
Piraporinha
Que na
juventude minha
Era colado
comigo
Sempre
quando venho sigo
Pra fazer-lhe
uma visita
Até hoje ele
acredita
Nessas
coisas de magia,
De macumba e
bruxaria
Tudo de
sessão espírita.
Estive no
mês passado
Com ele na
sua casa
Aí a gente
extravasa
Conversando
um bocado
Às vezes
fico assustado
Com as
coisas que ele conta
Mas comigo não
apronta
Sabe quando
recuar
Ou de
assunto mudar
A mim nunca
desaponta.
Nessa ele me
contou
Algo de
antigamente
Que guarda
na sua mente
Que do seu
pai escutou
Ainda mais
confessou:
“Nunca contei pra ninguém
Proquê pra prová num tem
São coisa de otros prano
E tem mai... tem muitos ano
Eu acho q’ué mai de cem!
Meu pai me contô assim:
Derna quand’eu piquinino
Q’eu uvia mãe dizê
Zé Giroime tem pudê
Acho q’ué pudê divino!
Só seno isso minino!
Num tem otra ispricação
Se num fô isso intão
Cuma é q’ele tá aqui
Dispoi aparece ali
Cuma fosse assumbração?
Otro dia ele tava
La pras banda do riacho
Na mão sigurano um cacho
De pitomba que chupava
As muié banho tumava
Nuas sem ligá cum nada
Em uma farra danada
Poi lá num havia home
Mai num é que Zé se some
Pra dá uma ispiada!
E quano ele quiria
Ir pra um forró dançá
Dava um jeito de entrá
Sem pagá e consiguia
Quano oiava se via
Zé Giroime já dançano
Grudado, se requebrano
Cum as muié no salão
Aquele ispertaião
Dos pudê anda usano.
E otras mai Zé aprontava
Sem gastá nenhum tustão
Ropa tinha de montão
Conde quiria pegava
Prefume nunca fartava
Carçado do bom tombém
Nota de cinquenta, cem
E namorada de mai
Fartava só o rapai
Sê o dono dum harém.
Ais vei ele inventava
De cum os otro bagunçá
Coisa que estava a cá
Notro canto ele butava
Aí ele se mutava
Nas coisa q’ele quiria
Queto num se rimixia
Fazeno ais vei de mudo
Dispoi que passava tudo
Sirrindo se divirtia.
Aí meu pai mai sensato
Compretava bem assim:
Eu sei timtim por timtim
Cuma procede esse fato
Eu iscutei um buato
Que tá puraí rolano
Que Zé tá se invurtano
Poi dixero que herdô
Um livro do seu avô
Que é de São Cipriano.
Ele ainda num tem
A metade dos pudê
Proquê só chegô a lê
As parte que le convém
De página são mai de cem
Cuma tem poca leitura
Essa pobe criatura
Usa de foima errada
Logo será disvendada
Toda sua aventura.”
Fiquei
impressionado
Com aquela
narrativa
Parecia estava
viva
Com tanto
detalhe dado
E depois de
eu ter voltado
Pra casa no
outro dia
Até parece
que eu via
Zé Giroime o
personagem
Retratado na
imagem
De alguém
que eu conhecia.
Aí fui
analisando
Será a mesma
pessoa?
Pense numa
história boa
Fui os
detalhes ligando
Daí fui
observando
Coisas que
presenciei
Mas atenção
nunca dei
Do jeito que
deveria
Mas depois
daquele dia
Pra tal fato
despertei.
Eu analisei
assim:
Um encontro
eu marquei
Com a minha
namorada
Numa casa
abandonada
A ninguém
nunca contei
Quando eu
menos esperei
Esse alguém chega
pra mim
E diz
sorrindo assim:
“Acha que me despistasse
Eu tava lá nem notasse
Pense num encontro ruim!”
Não podia
ser verdade
Isso me
deixou bolado
O tal do
local marcado
Muito além
da cidade
Era uma
tranquilidade
Era o maior
deserto
Não tinha
ninguém! Tô certo!
Disso me
certifiquei!
Mas...
espera! Me lembrei!
Tinha um
gato lá perto.
Outro dia a
gente estava
Em um bar
tomando uma
Tinha
cerveja de ruma
Cada rodada
um pagava
Ele era quem
mais tomava
Numa grande euforia
Quando ele
percebia
Sua vez de
pagar chegando
Já ia
se despistando
E de repente
sumia.
Isso sem
contar que a gente
Curtia uma
noitada
A casa de
show lotada
Lá dentro e
lá na frente
Quando vejo
de repente
Tome soco
pro meu lado
E não é que
o danado
Lá dentro
fez confusão
O pau quebrou
no salão
E ele lá
fora sentado.
E o mais
interessante
Que ele nem
deixa sinal
É uma coisa
anormal
Deveras
impressionante
Tudo de
gente importante
Ele sabe, e
sai contando
Ninguém o vê
frequentando
A casa de
seu ninguém
Por isso
digo esse alguém
Só pode está
se “invurtando!”
Tem dinheiro
e casa boa
Só anda todo
alinhado
Gordo, bem
alimentado
Não trabalha,
vive à-toa
É uma boa
pessoa
Também não é
nada feio
De nada ele
tem receio
Aqui, ali, acolá
Em toda
farra que há
O peste está
no meio.
Eu já estou
convencido
Tenho
certeza que é ele
Zé tomou o
corpo dele
Ele está
possuído
Ou senão
deve ter lido
Também o São
Cipriano
Que transforma
um fulano
No que quer é só
querer
É verdade
esse poder
É coisa de
outro plano!
Meu grande
amigo está certo
Ele tem toda
razão
Vou prestar
mais atenção
Vou ficar bem
mais esperto
Quando esse
alguém tiver perto
Nele vou
ficar ligado
Pra não ser
ludibriado
E nem lesado
também
Por poderes
do além
De um cabra
invurtado!
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