segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

O HOMEM QUE SE APAIXONOU POR UMA MANEQUIM

(Benildo Nery)


Conheci Zé do Arisco
Pras bandas de Caicó
Um cabra grande figura
Curtia farra e forró
Onde havia um estava
Mas algo lhe aperreava
Zé nunca teve um xodó.

Teve uma infância difícil
Pela sua mãe criado.
Trabalhava todo dia
Em um pequeno roçado
Que perto a casa ficava
E ali ainda criava
Umas cabeças de gado.

Também criava galinha
Pato, peru e guiné
Uns porcos, alguns cabritos
E um cavalo pangaré
Que comprou do tio João
Pra servir de condução
Pra não ir à rua a pé.

Por viver muito ocupado
Escola não frequentava
Mesmo assim aprendeu
Palavrinhas soletrava
As quatro operações
Em várias ocasiões
Ele sempre calculava.

Era um sujeito esperto
Querido na região
Desde o Sítio Lageiro
Até o Sítio Grotão
Dos cantos mais afastados
Ariscos, secos, molhados
Ao seu humilde rincão

De vez enquanto saia
Para uma biritada
Mas sempre coisa pouquinha
Nunca coisa exagerada
Por ter um pouco de medo
Pra casa voltava cedo
Antes da noite findada.

No dia que ia sair
Pra essa tal biritada
Adiantava o serviço
A comida era botada
Paro os bichos que criava
Sua mãe observava
Até a sua chegada.

Dançava, tomava umas
Com um ou outro amigo
Sempre com muita cautela
Por ter horror de perigo
As moças observava
Mas Zé nunca as chamava
Pra que dançasse consigo.

Ele mesmo não entendia
O porquê dessa quizila
Não era uma cabra feio
Nem dos mais pobres da vila
Mas lhe dava tremedeira
E uma enorme suadeira
Se pra dançar fosse à fila.

Não conseguia sequer
Uma palavra esboçar
Ficava todo nervoso
Com os braços a balançar
E as pernas bambeando
Então logo ia sentando
Para poder relaxar.

Essa era a sua rotina
Zé acostumou-se assim
Vivendo com sua mãe
Lá no Sitio Bom Jardim
Mas vez em quando a pensar:
Eu tenho que arranjar
Uma mulher para mim!

Mas a morte que já tinha
Lhe tirado o seu pai
Outra vez com o seu peso
Sobre o seu ombro recai
Sua mãe e companheira
Suspira a vez derradeira
E pra outra vida vai.
  
E agora Deus do Céu?
Me diga o que fazer!
Nesse mundo assim sozinho
Como é que eu que vou viver?
Tenho que me organizar
Pois eu não vou aguentar
Viver nesse padecer!

Tenho que tomar um rumo!
Revirou a sua mente
Sempre tendo como foco
O que viria pela frente
O sítio pôs pra vender
Pra na cidade ir viver
De forma bem diferente.

Não demorou muito não
Vendeu a sua terrinha
Os objetos rurais
E as criações que tinha
Com o dinheiro recebido
E pelo sonho atraído
Rumou pra nova vidinha.

Com o dinheiro do sítio
Comprou logo uma casinha
Numa rua principal
Bem pertinho da pracinha
Também comprou a mobília
Na loja de Dona Emília
Pagou de uma vez todinha.

No começo estranhou
A vida de novidade
Não estava acostumado
Nunca morou na cidade
Em contado com uma prima
Aos poucos entrou no clima
Mergulhou na vaidade.

Mudou o estilo de roupa
E o jeito de andar
Novo corte de cabelo
O jeito de se comportar
Zé agora era o tal
Mas faltava o principal
Uma mulher pra casar.
  
Começou a frequentar
Um clube ali da cidade
Todo final de semana
Com grande assiduidade
Nova amizade arrumou
E pensava assim: estou
Rumando a felicidade.

Mas uma coisa ainda
Permanecia igual
Apesar de muito esforço
E uma força brutal
Seu tremor continuava
Quando em mulher encostava
Começava a passar mal

Vale lembrar que a rotina
Muito passava a custar
Era grande a gastança
Que ele tinha que bancar
Como grana não é pasto
A sua com tanto gasto
Começou a se acabar.

Em pouco tempo acabou-se
Toda a sua herança
Tudo o que tinha guardado
Em casa e na poupança
Já perdendo a autoestima
Foi buscar na sua prima
Outro fio de esperança.

Sua prima Jovenice
Tinha uma confecção
Lá nos fundos, funcionava
Em um pequeno galpão
E por tá necessitado
Zé passou a empregado
Teve o primeiro patrão.

Todos os sonhos de Zé
Pareciam encerrado
Ele sempre independente
Agora um mero empregado
Mas não fez pouco da sorte
E por ser um cabra forte
Cedinho tava pegado.

Antes dos outros chegarem
Tudo Zé já ajeitava
Linhas, fazendas, botões
Tudo, tudo organizava
Mobília e equipamentos
E outros mais implementos
Ele muito bem zelava.

Jovenice também tinha
Na frente de onde morava
Uma loja onde vendia
Tudo quanto fabricava
E outras mercadorias
E na semana dois dias
Zé também lá arrumava.

Um dia chegou mais cedo
Bem mais que o habitual
Já ia se preparando
Para arrumar o local
De um susto estatelou-se
Foi quando ele deparou-se
Com algo fenomenal

Um e oitenta mais ou menos
Possuía de altura
Os peitos bem redodinhos
Bem fininha a cintura
Usava uma peruca
Curtinha que via a nuca
Que mais linda criatura.

Usava uma roupa simples
Camiseta e shortinho
A camiseta transparente
E o short bem curtinho
E Zé por ser bem esperto
Se encostou, olhou de perto
E lhe mandou um beijinho.

Ela era muito séria
Com os olhos a lhe fitar
Um olhar tão poderoso
Zé deixou-se se levar
Sem sentir nenhum tremor
Sentiu no peito o amor
Deixou-se se apaixonar.

Não dizia uma palavra
Sempre de boca fechada
Não comia, não bebia
Não reclamava de nada
E Zé sempre do seu lado
Lhe enchendo de agrado
Zelando a sua amada.

Daí em diante a vida
Dele se modificou
Por entender que o dia
Tão esperado chegou
Estava tão animado
Gritando pra todo lado
Que um xodó encontrou.

Já não fazia mais nada
Das suas obrigações
Jovenice observando
As sua novas ações
Resolveu naquela hora
Mandar  o Zé dar o fora
Das suas instalações.

O Zé então decidiu
Por em prática outro plano
Juntou o que tinha ganho
Como salário no ano 
Sabia não ia dar
Mais tinha pra completar
Viveria igual cigano.

Vendeu tudo o quanto tinha
Pegou sua namorada
tratou com a sua prima
E com as contas acertada
Pois suas coisas na mala
E saiu feito uma bala
No mundo cortando estrada.

Onde ele anda hoje
Ninguém pergunte pra mim
Se ele ainda é vivo
Ou se talvez levou fim
Mais uma coisa é incerta
Foi viver uma vida certa
Com uma diaba manequim.

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